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quinta-feira

Humor Inteligente

A Fan Page Humor Inteligente vem fazendo enorme sucesso no Facebook há meses, com cerca de um milhão e meio de pessoas "falando sobre isso". Seu criador e administrador, Wilson Senne, recentemente, falou sobre o que pensa do humor em entrevista ao jornal A Gazeta, de Vitória do Espírito Santo.

Leia abaixo as respostas de Wilson na íntegra, e a reportagem por Tiago Zanoli.


1. Por “humor” entendo “estado de espírito” ou “de ânimo” em geral, quer dizer, sem ser resumir ao sentido de bom-humor ou humor alegre - pois também há mau humor, humor colérico, humor negro, etc. E “inteligente” não no sentido de “intelectual” ou “culto”, necessariamente, mas por contraste com o humor derrisório, depreciativo, calcado em estereótipos – o “humor baixaria” que é bastante comum. “Inteligente”, como entendo,
tem portanto mais a ver com refinamento, sutileza, delicadeza do que com capacidade de raciocínio lógico ou Q.I. (Quociente de Inteligência).

2. Creio que a conotação elitista existe – “inteligente” é comumente usado para caracterizar quem (ou o que) é mais inteligente que outro; a conotação de pedante vem por decorrência mas me parece menos expressiva, e de preconceituoso menos ainda pois “inteligência” é frequentemente colocada em oposição à “preconceito”. O sentido “hierárquico” do termo inteligente (superior, médio, inferior etc.) não ofusca outros sentidos, mais eminentes, do termo “inteligência” como aparece nos dicionários, ou seja, como “capacidade de conhecer, compreender e aprender”, ou como “capacidade de resolver problemas”. Assim, podemos dizer que “humor inteligente” é uma expressão que leva de uma parte o sentido da comicidade, da graça, da jocosidade, (características principais do termo “humor”), mas que enquanto “inteligente” também agrega algum conteúdo cognitivo, ou seja, é um humor “construtivo”, que “ensina” algo, ou como diziam os antigos, humor “edificante”.

3. É uma linha tênue entre o humor popular e o inteligente, desconfio inclusive que muitos humoristas começam inteligentes e tendem a “popularizar”, se assim se pode dizer, mas possível, sim. Para citar um exemplar do tipo de forma humorística que frequento, que é o universo das tirinhas, cartuns e charges, diria que a Mafalda, personagem do Quino, é um humor popular (quase todo mundo conhece e “curte”) e inteligente (Quino fazia uma crítica social e existencial de primeira qualidade). Talvez essa síntese desponte mais e melhor em certos momentos históricos, como pareceu, nos anos 80, o caso do humor de Angeli, com a revista Chiclete com Banana, Laerte, com a Piratas do Tietê, e Glauco, com Geraldão. Ao mesmo tempo que o humor que produziam se tornava popular (Angeli “matou” sua personagem Rê Bordosa exatamente por isso!), havia toda uma atualidade nos traços e nos temas, sentíamos que anunciava um tempo novo nessas revistas.

4. Se alguém pergunta do “humor feito no Brasil”, quer dizer, suponho, humor televisivo, como mais conhecido: Zorra Total, A praça é nossa... Se for isso só dá para dizer que vai mal, que repete clichês de apelo popular há décadas, que não apareceram novidades.

5. O humor moldado por Chico Anysio, de fato, fez muitos seguidores, que infelizmente não chegaram até agora a repetir o brilho do mestre. Entre a fórmula que se repete, a maneira como é aplicada e o talento dos que – com ela, para além dela – introduzem variações e criam novas formas, o equilíbrio é sutil. É difícil imaginar uma produção de humor que não recorra – em diferentes medidas - a estereótipos, fórmulas ou clichês; mas tem vários outros componentes que podem impedir que fique reduzido a isso: a inteligência enquanto conhecimento ou aprendizado de conteúdo informacional, crítico ou cognitivo, por exemplo.