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segunda-feira

"Antropofagia" é o barato!

Programa (provisório) do curso "Do matriarcado primitivo à sociedade contra o Estado: cartografia da hipótese antropofágica"


Toda vez que vem à tona, o cadáver de Oswald de Andrade assusta
Décio Pignatari

O curso tem como eixo uma leitura detalhada dos diversos escritos teóricos de Oswald de Andrade sobre a noção de antropofagia, em particular o texto intitulado "A psicologia antropofágica", a tese "A crise da filosofia messiânica" e o ensaio "O Antropófago". O objetivo é, em primeiro lugar, mapear o campo de referências desses textos, desde suas fontes inspiradoras fundamentais -- Montaigne, os "três gênios Marx, Nietzsche e Freud", a antropologia vitoriana (Bachofen, Morgan, Engels) e clássica (Malinowski, Lévi-Strauss) -- até o horizonte filosófico contemporâneo, do pragmatismo e do bergsonismo ao marxismo e ao existencialismo.
Em segundo lugar, trata-se de discernir a "concepção de mundo" que OA associa à noção, isto é, qual a antropologia expressa na antropofagia. Interessa-nos aqui sobretudo a dimensão político-filosófica desta concepção (teorias do matriarcado primitivo e do sentimento órfico), bem como a metodologia analítica proposta (paleontologia social, errática). Estabelecer as analogias entre a antropologia oswaldiana e certas reflexões mais recentes sobre as sociedades primitivas (notadamente a obra de Pierre Clastres), bem como entre sua metodologia e os temas da "arqueologia" e da "genealogia" constituem nosso terceiro objetivo. As relações entre a antropologia de OA e a etno-antropologia ameríndia (tal como reconstituída pela etnologia filosófica contemporânea) são um quarto tema do curso. Por fim, as perspectivas abertas pela Antropofagia permitirão um diálogo com trabalhos recentes sobre a crise radical do antropocentrismo e a emergência de uma nova filosofia política da natureza.
A tese defendida aqui toma a Antropofagia, no sentido conceitual específico que lhe conferiu Oswald de Andrade, como designando o impensável metafísico constitutivo da tradição ocidental, a figura de máxima alteridade relativamente ao complexo nativo do Velho Mundo, a tríade Estado-patriarcado-messianismo.